quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Várias Palavras


  Hoje é o dia de ME começar a descobrir, de perceber que estou a construir um puzzle enormíssimo de mim própria...
  Á medida que vou encaixando as peças, converso com as mesmas e acontecem fenómenos bizarros...Há várias que se colam sem eu as juntar e que partem de barco para Veneza a chorar lágrimas de ouro, cantar gotas de vinho e a fazer amor dentro da lua cheia. Umas dizem-me que ficarão por tempo indefinido, mas com a promessa de que voltarão com barrigas de sabão. Outras encaixam, mas ficam mudas e amnésicas, enquanto as gagas assumem uma atitude criminosa e desfazem as vizinhas com balas de canhão, por isso fica sempre uma história suspensa. A mais pequenina dorme no meu quarto e ontem, já cheia de sono, sentou-se no meu dedo e perguntou-me:

 "- Quem és tu? Ontem tinhas dois elásticos na boca e hoje estás a sorrir... há segundos estavas com um vestido de veludo cor de vinho e um arco-íris despiu-te sem dares conta. Como te chamas? Porque não entras dentro de mim?" 

 Então, transformo-me em vento, e começo a declarar aos quatro cantos do universo: 

 "- Olá, sou a Francisca. Por vezes, deixo partes de mim em recantos escondidos deste planeta que facilmente se derretem ou voam à velocidade do meu coração. É simples, só quero ser feliz."

 Ultimamente... Bem, as palavras estão neste momento espalhadas num labirinto incerto... As mais novas querem estar num parque a andar num baloiço amarelo em forma de berço e descer num escorrega de penas. Não conseguem parar de brincar com os patos roxos com contornos picotados, dar pão aos pombos e fazer desenhos de cera com os peixes. As mais tímidas escondem se na asa do pombo ferido que vimos hoje e seguem no em direção ao lago. Foi assim que morreram inesperadamente com o mesmo, que já tinha desistido de voar, porque o mataram mentalmente, ou porque, simplesmente, estava cansado de si próprio. Porém, não me quis revelar o motivo, pois estava ocupado a estruturar a sua morte. 
 Começou por caminhar em círculo incerto à nossa volta, talvez para sentir um certo conforto no meio da respiração, mas expulsámo-lo suavemente com gestos de dança. Não demorou muito tempo para que começasse a caminhar e foi assim que desapareceu entre as ervas sem olhar para trás... O seu espírito, que ainda estava entranhado nas penas sujas e frágeis, chamou-me e sentei-me na água sem cair. Quando o vi descer, com os olhos sem esperança, puxei o de imediato, e foi então que me disse a primeira palavra, que foi, por sua vez, a última da sua existência na terra:
"- Neste momento não quero a tua mão. Traz-me de novo a vida. Abandona- me para que me possa encontrar". 

Respeitei o seu pedido e vi o desaparecer lentamente com as palavras que não tinham bóias. Ficaram umas bolhinhas à superfície que a minha respiração de sangue absorveu em segundos. O arco-íris que me despiu, saiu de baixo de água com 3 sinais em forma de estrela que me roubou da anca para servir de ponte ao seu espírito, e a ave caminhou livremente até ao céu.
  As palavras mais velhas querem dançar freneticamente num cubo de gelo até entrarem por mim em fila indiana. As palavras que tenho agora no meu peito não me deixam continuar a escrever e falam por si: Será que a paixão pode aparecer num dia de chuva sem ficar no teu cabelo encaracolado? Olho para ti, que não existes ainda, pois só te imaginei, e entras na minha boca a tocar guitarra, mas por vezes ficas na poltrona do meu lábio a dizer-me adeus com os olhos e segues o teu caminho sem olhar para trás. Será que ainda não te posso ter porque tenho de me centrar? A peça mais pequenina deitou-se novamente ao meu colo e não a quero acordar com mais palavras.





                                                                                                                06/2010                  

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